quinta-feira, 29 de julho de 2010

O Artista: Ricardo Basbaum

Artista Etc



Alunos:
Amanda Xavier,
Erika Macedo,
Letícia Saraiva, e
Luísa Espindola

21/07/2009


Introdução

O trabalho final visa à pesquisa sobre a relação do artista com o mundo público das artes. Uma análise das mudanças na arte e na crítica de arte no cenário da cultura globalizada, que conduz à necessidade de debater os processos atuais da comunicação da arte e do papel desempenhado pelos principais agentes legitimadores do sistema artístico, entre eles os museus, as bienais, o mercado de arte.
A pesquisa se realizou a partir da entrevista com o artista Ricardo Basbaum, professor da Uerj, crítico de arte, curador e autor de textos como: “Vivência Crítica Participante” e “O Artista como Curador”, em que defende a multiplicidade do papel do artista contemporâneo. Foi baseada na leitura de textos como: "Ato Criador" de Duchamp, "Inserções em circuitos ideológicos" de Cildo Meireles, uma entrevista de Carlos Zílio a revista Malasartes e dois textos de Basbaum citados acima.
Na pesquisa, verifica-se que o artista contemporâneo tem que ser muito mais do que criador de sua obra. O artista de hoje tem que procurar se envolver em todos os segmentos do sistema de arte, tem que ter contatos mais diretos com a crítica, o museu e a galeria, pois ao longo dos tempos as formas de institucionalizar um artista e suas obras se modificaram muito. Não é mais apenas o artista e a sociedade e sim o artista e a crítica, o museu e a galeria.
Nesta entrevista com Ricardo Basbaum podemos entender o papel do artista diante do sistema de arte e como essa relação se modificou ao longo dos tempos e qual o papel e a importância da sociedade na legitimação de uma obra. Basbaum também nos fala da força das Universidades no processo de formação artística.


O artista: Ricardo Basbaum

O artista Inicia seu trabalho a partir dos anos 80, numa perspectiva de investigação de diversas formas de linguagem, aproximando campo artístico e campo comunicativo, realizando performances, ações, intervenções, textos, manifestos, objetos e instalações. Sua formação inclui Licenciatura em Ciências Biológicas (UFRJ, 1982) e Especialização em História da Arte e Arquitetura no Brasil (PUC-RJ, 1987).
Possui obras suas nos acervos do Museu de Arte de Brasília, Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, Coleção Gilberto Chateaubriand (Rio de Janeiro) e The Tate Collection (Londres).
Publicou diversos textos em revistas especializadas, no Brasil e no exterior. É autor de Além da pureza visual (Zouk, 2007), e dos livros de artista G. x eu (1997) e NBP x eu-você (2000). Organizou a coletânea Arte Contemporânea Brasileira – texturas, dicções, ficções, estratégias (Contra Capa, 2001). Colaborador dos livros The next documenta should be curated by an artist, ed. Jens Hoffmann, Frankfurt, Revolver, 2004, e Interaction: artistic practice in the network, org. Amy Scholder e Jordan Crandall, Nova York, Eyebeam Atelier e D.A.P., 2001, entre outros. Entre 1999 e 2003, foi co-diretor da iniciativa independente Agora - Agência de Organismos Artísticos. Co-editor da revista item, voltada para arte e cultura contemporânea. (sv)



Entrevista


1)De acordo com Duchamp, no Ato Criador, "o artista passa da intenção à realização através de uma cadeia de reações subjetivas. Sua luta pela realização gera uma série de conflitos que não podem e não são totalmente conscientes. E o resultado desses conflitos é uma diferença entre a sua intenção e a sua realização, uma diferença que o artista não tem consciência. Essa diferença entre o que quis realizar e o que na verdade realizou é o ‘coeficiente artístico’ pessoal contido na sua obra de arte”. Você concorda com esse ponto de vista? O artista contemporâneo poderia ser pensado nesses termos?

2) Em seu texto, Vivência Crítica Participante, você declara que o ser artista ou funcionar como tal, se quiser, não é conseqüência apenas de vontade e perseverança, mas de uma sutil negociação com vistas à inserção num campo de debates e jogo cultural, ou numa sociedade. Qual a relação, hoje, entre o artista, o mundo público das artes, o público e as instituições? Em seu texto "O artista como curador",você afirma que as funções dos artistas ultrapassam a posição de simples produtor de obras de arte. Você tem uma proposta do artista como curador, professor, crítico. Você poderia desenvolver mais essa proposta?

Ricardo Basbaum: É uma sugestão interessante do Duchamp. Todos os textos dele tem um tom provocador. Ele toca de uma maneira muito direta e até simples nesse problema entre o que é feito pelo artista e como isso é recebido pelo público. Na verdade mostrando que a obra não contém, ela um conteúdo que o artista delega a obra e aquele conteúdo está para ser exposto da mesma maneira que o artista colocou , da mesma maneira que a comunicação não é uma transmissão de uma coisa simplesmente, por exemplo, eu falo maçã. E essa maçã entra no seu cérebro como maçã. É muito mais algo que está ligado a uma tecla dos elementos, a comunicação tem uma performatividade, tem um jogo de contato, tem uma série de lacuna e vazios, então Duchamp está jogando com isso, está mostrando que a obra de arte que estamos nos propondo enquanto artista moderno e já apontando para uma arte contemporânea é tida pelo receptor da obra. A recepção de uma obra diz muito, não existe uma obra em que o artista diz finalizada, pronta e que esse público simplesmente, recebe o pacote de informações que todo é mediado por certo tipo de som. Não é mais o artista e a sociedade simplesmente, mas sim, o artista e o museu, o artista e o circuito, o artista e o mercado, o artista e a crítica, e a crítica e a história, sobretudo que a arte contemporânea lida com o público de um modo muito nobre, além de tudo, dentro de um espaço ligado pela cultura como a música popular, ou até mesmo o cinema, como música. O campo da arte visual depende de contatos muito mais intensos em menor escala, mais lentos, do que a arte popular e a arte do cinema.
Hoje tem no Banco do Brasil a exposição "Virada Russa" que tem certas obras que certamente não voltarão para cá tão cedo, então se você não tem um contato direto não vai entender e perceber o que é aquilo. É muito mais lento e mais intenso. O artista depende, também que estar sensível, ser capaz de problematizar certas demandas da sociedade e isso produz um interesse meio volátil. Antes de atender ao interesse do público é muito mais encontrar um ponto de contato.
Essa idéia do artista etc. vai mais do que simplesmente ficar no atelier fechado. Isso deve muito mais a perceber que para, enquanto dever de produzir algo, enquanto artista frente a sociedade, não depende simplesmente de um acolhimento ou de um sim da sociedade- aceitamos você- mas muito mais desse trabalho de construir esse lugar e negociar essa recepção, mostrando uma provocação qualquer. É preciso construir um espaço para o trabalho, e esse espaço não construímos só na produção da obra no atelier. Você precisa compreender que seu trabalho possui uma demanda crítica, precisa entender que precisa trabalhar nesse ambiente também, produzir textos que defendam o seu trabalho, articulem o seu trabalho enquanto artista. É preciso compreender também que construir a intenção do trabalho, isso se aproxima só trabalho do curador. Se associar com outros artistas, formando grupos, um coletivo, um espaço de trabalho conjunto e aí você se aproxima do curador, no sentido de construir eventos. Não ficar esperando que as pessoas te chamem para fazer as coisas, mas já construir uma situação, você já se coloca.
Então, é muito mais essa idéia do artista que pensa , é perceber esses outros campos é muito mais a realidade do artista contemporâneo do que achar que o artista fica isolado no atelier. Precisa compreender que o trabalho precisa de uma discussão crítica, um discurso histórico, precisa construir um espaço para o trabalho de uma maneira que a gente não afirme muito, uma espécie de uma ação constante para construir a intenção do trabalho.

3) Cildo Meireles, em seu texto "Inserções em circuitos ideológicos" fala sobre a noção de público que foi substituída pela noção de consumidor, que é a parte do público que teria poder aquisitivo. Além de isso tornar a arte pouco acessível, a busca do público por entretenimento hoje em dia a torna mais comercial. Você percebe, como artista, a mudança no perfil do público? Até que ponto o público consumidor afeta a produção artística?

Ricardo Basbaum: Há uma mudança sim. As artes plásticas pertencem ao mundo das Belas Artes, ali voltado para uma corte, mas se dissolveu na era moderna, ficando um certo retoque , uma espécie de lugar na esfera burguesa enquanto ao mesmo tempo a música popular, o cinema, como atividades industriais conquistam um público na velocidade de contato, um acesso aos meios de comunicação que parecem que deixam as artes visuais um pouco para trás nessa questão da velocidade. Mas a partir da Pop Art, a partir da Segunda Guerra Mundial, isso começa a virar um pouco, as Artes Visuais perdem aquele lugar mais protegido , junto a uma esfera de reserva, o espaço mais protegido das Belas Artes e rompe completamente. Passa a confrontar com a economia, dentro da cultura no seu estado mais direto, no contato com o jogo de capital mais agressivo, as galerias percebem que têm que usar estratégias de publicidade também, entra no campo da cultura como qualquer outro, é sediada da mesma maneira pelos meios de comunicação, só que não vai responder da mesma maneira como a música e o cinema.
Então, eu acho que as Artes Visuais ainda estão procurando lugar nessa economia da cultura pós uma "arte de consumo de luxo". Além de que a Arte Visual ainda é uma peça única e isso custa muito caro, um filme se multiplica centenas de cópias e um disco de música também, mas quando é única custa muito caro dentro de uma economia que barateia só quando aquilo se multiplica, então, será um bem de consumo sempre caro, mas para consumir uma obra de arte você não precisa ter ela materialmente em casa, é como temos um sapato, ela pode ficar no museu e você consome da mesma maneira.Nesse aspecto as Artes Visuais tem uma camada muito elaborada sobre o consumo material, mas o contato já está bastante elaborado e a gente pode ter esse contato com a obra de maneira muito rica, em produção de pensamento, pensar sobre o conceito de arte. Tudo isso a obra nos proporciona, e talvez o cinema não demande tanto. Eu não preciso levar uma obra para casa para consumi-la.
No sentido do que é produzido não, mas ajuda a pensar a maneira de recepção, de mediação sua e percepção da obra. No Brasil é importante todos os museus terem um departamento técnico-educacional, já que aqui não tem museus, não tem acervos, então as pessoas não têm como conviver com aquilo mais tempo, aparece de repente... É preciso construir esse acesso, isso é uma demanda do público. Esses eventos de grande escala, espetaculares, como a bienal, que também é para suprir uma ausência dos museus. Acho que o público não determina tanto a produção, mas sim a maneira de organizar essa recepção.

4) Você é professor da UERJ e participa da formação de futuros artistas e agentes do sistema de arte. Como você vê o papel da universidade na formação do artista contemporâneo no Brasil?

Ricardo Basbaum: A formação acadêmica do artista é muito importante , ela de certa forma substitui a antiga "Escola de Arte". Mas a Universidade não garante que a pessoa que se formou será artista, não depende apenas de um diploma, depende de todo esse jogo que já comentamos antes- como a sociedade, essas negociações. O que a universidade tem que eu acho muito importante é esse espaço de encontro e de debates. Ela nesse sentido é estimulante, um espaço de troca de idéias, de contatos, provocações, criando uma atmosfera de inquietação.

5) Você foi um dos fundadores e participou ativamente do Espaço Agora Capacete. Ele era um espaço de circulação de idéias e debates e foi importante para a formação de desenvolvimento do trabalho de inúmeros artistas. Você poderia falar dessa experiência?

Ricardo Basbaum: O Agora Capacete na verdade são dois grupos, o Agora e o Capacete. O Capacete está ativo até hoje. O Agora se dissolveu em 2003. O Agora já tinha uma experiência anterior, ele era composto por três pessoas, contando comigo. Nossos encontros com o Capacete foram muito interessantes, nós tivemos um espaço para trabalhar em conjunto e pensar, fazer uma intervenção no circuito de arte local, marcar uma diferença. Criar um espaço em que a gente pudesse construir exposições, promover debates, produzir uma conversa crítica. Foi bastante interessante, porque os dois grupos atuando junto, e cada um com suas referências, cada um com seu tipo de produção e se encontravam em um equilíbrio. A idéia era criar um espaço de fomento para a produção, produzir idéias, criar um espaço de rede, mexer com a comunidade artística local, aglutinar as pessoas. É muito mais uma vontade de construir a intenção do trabalho. Faz parte das estratégias de colocar a própria obra para a sociedade. Construir as relações que fazem parte do trabalho. O encontro da produção com a cidade do Rio de Janeiro

Referências Bibliográficas:

DUCHAMP, Marcel. O Ato Criador. In BATTOCK, Gregory. A nova Arte. São Paulo, Editora Perspectiva. 1975.

BASBAUM, Ricardo. O artista como curador. In FERREIA, Glória.( org.) Crítica de Arte no Brasil: Temática Contemporâneas. Rio de Janeiro, Funarte. 2006.
_________________. Vivência Crítica e Participante. Revista Ars. São Paulo, ECA-USP. N 11.2008.

MEIRELES, Cildo. Inserções em Circuitos Ideológicos. In HERKRNHOFF, Paulo, MOSQUEIRA, Geraldo, CAMERON, Dan. Cildo Meireles. São Paulo, Cosac & Naif. 1999.

ZILDO, Carlos.In; Escritos de Artistas dos anos60/70. Rio de Janeiro. Jorge Zahar Editor.2006

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